dezembro 14, 2006

Leituras (no Metro)

" Bom, para voltar ao que estávamos a falar...Dizias tu que não te importarias de casar com uma rapariga que tivesse seis dedos, mas não com uma que tivesse quatro mamas.
- Não foi isso que eu disse. O que eu disse foi que não sabia.
- E por que é que não sabes ?
- Porque não sei...Tenho dificuldade em imaginar.
- E consegues imaginar alguém com seis dedos ?
- Consigo, mais ao menos.
- Onde é que está a diferença ? Quer dizer, entre seis dedos e quatro mamas ?
Voltei a reflectir mais um bocado naquilo, mas a verdade é que não me ocorreu nenhuma explicação decente ! "

(Também não consigo imaginar uma rapariga com seis dedos !!!)

In: Pág. 26 - Crónica do Pássaro de corda - Haruki Murakami

" Não tenho por hábito ficar emocionalmente perturbado durante muito tempo por causa das minhas relações com os que me rodeiam. É evidente que acontece às vezes sentir-me chateado ou irritado com alguém. mas nunca dura muito tempo. Tenho a capacidade de distinguir entre mim e os outros, de saber discernir entre o meu território e o território alheio ( creio que lhe posso chamar a isso capacidade, uma vez que, e não é para me gabar, estamos perante uma espécie de talento, nada fácil de pôr em prática). Em resumo, quando estou descontente ou irritado por qualquer coisa, transfiro o objecto do meu desagrado para um território estranho que não tem qualquer relação pessoal comigo. Depois digo assim para comigo: "Tudo bem, neste momento estou chateado e irritado mas a causa disso, transferi-a para outra esfera, já não está aqui. Mais tarde, com a cabeça fria, logo tratarei de analisar as coisas tranquilamente a fim de tomar uma decisão." E isso permite-me congelar durante algum tempo os meus sentimentos. Num segundo tempo, quando regresso a eles e procedo, com toda a calma, à sua análise, ás vezes dou por mim ainda com os ânimos exaltados, mas é raro (raríssimo). Passado um certo tempo, a maior parte das coisas perdem a sua virulência e tornam-se inofensivas. Mais cedo ou mais tarde, acabo por esquecer tudo. Até agora, ao longo de grande parte da minha vida, e graças ao uso apropriado deste sistema de gestão dos meus sentimentos, evitei muitos problemas inúteis e consegui manter o meu mundo interior numa situação relativamente estável. E confesso que me orgulho bastante por me ter mostrado capaz de manter a funcionar um sistema tão eficaz."

In: Pág 90 - Crónica do Pássaro de corda - Haruki Murakami

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