Fausto:
Em nenhum hábito deixarei de sentir
A dor da vida estreita que levar.
Sou muito velho para só querer brincar,
E muito novo para sem ânsia existir.
Que tem o mundo hoje para me oferecer?
A renúncia! Deves renunciar:
É essa a eterna ladainha
Que a todos nos ouvidos ecoa
E que, uma vida inteirinha,
Uma voz rouca sem fim apregoa.
Acordo de manhã numa agonia,
E lágrimas amargas só me traz
O tempo que decorre, e em cada dia
Nem um desejo só me satisfaz;
Até do prazer o antegozo
Me estraga com espírito invejoso,
E do sopro criador da alma activa
Com mil esgares hostis também me priva.
E depois, quando a noite nos envolve
E eu no leito caio, angustiado,
Também então a inquietação revolve
Os sonhos que me deixam aterrado.
A divindade que em meu peito mora
Pode agitar-me a alma até ao fundo;
Em minhas forças manda, mas lá fora
Não tem poder sobre as rodas do mundo.
E assim a existência me é um peso,
A morte ansiada, a vida um ódio imenso.
Goethe, in Fausto
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