março 02, 2007

19º
Noite quente
Sabia bem tanto no Inverno como nas outras estações do ano, sobretudo emnoites frescas quando o trote do relógio se fazia notar pelo desconforto da frieza na pele. Foi achando cada vez menos piada ao conjunto, que revelava uma falsa preeminência sob o pretexto da igualdade entre pares. Mas a peça mais simples de todas, aquela que era efectivamente útil pelo conforto que proporcionava e pela aura de mistério que a envolvia, essa, anda hoje faz parte do seu imaginário da paixão. A dimensão generosa e o negrume protector permitiam, com um gesto rápido e decidido, ocultar dois amantes sequiosos entre a mais numerosa multidão, dando plena liberdade aos movimentos frenéticos da boca de cada um e abafando discretamente os murmúrios que prenunciavam desfecho a sós. No meio da torrente em movimento descontrolado, era como se estivessem no centro de um tufão, onde se diz reinar uma paz enganadora, prenúncio da luta titânica contra os elementos em fúria que tudo arrastam e esmagam à sua passagem. Depois da tempestade de vozes e encontrões, de acordes e poemas, aquelas noites traziam o encanto dócil do calor dos corpos envoltos em tecido de lã,negro como o mistério das noites de prosa espontânea e risos de prazer, sangue fervente, traços largos de imaginário em cavalgadas de freio nos dentes. Ficassem os corpos desfeitos em fragmentos indefinidos, as mãos cheias do sabor agridoce de coxas, antebraços, faces e seios, olhos brilhantes, íman para o recomeço da batalha, rotações sucessivas pelo chão em brasa até que o universo da matéria tocasse a porta de entrada para aquinta dimensão.

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