setembro 16, 2008

(3ª parte)

Eu venero a palavra de Deus, pois amo a sua força poética. E abomino a palavra de Deus, pois odeio a sua crueldade. O amor é um difícil amor, pois tem constantemente que destinguir entre o fulgor das palavras e a exaltada submissão a uma divindade presumida. O ódio é um difícil ódio, pois como é que podemospermitir-nos odiar palavras que participam da própria melodia da vida nesta parte do mundo? Palavras que nos ensinaram, desde o início, o que significa a reverência? Palavras que para nós foram como que fanais, quando começamos a pressentir que a vida visível não pode ser toda a vida? Palavras sem as quais não seríamos aquilo que somos? Mas não nos esqueçamos: são palavras que exigem de Abraão que ele sacrifique o seu próprio filho, como se de um bicho se tratasse. O que é que fazemos com a nossa ira quando lemos isso? O que pensar de um tal Deus? Um Deus que acusa Job de disputar com ele quando nada sabe e nada entende? Quem foi que o criou assim? E por que é menos injusto quando Deus lança, sem qualquer motivo, alguém para a desgraça do que quando é um comum mortal a fazê-lo? Não terá Job todos os motivos para a sua queixa? A poesia da Palavra divina é tão avassaladora que tudo silencia. Toda e qualquer contestação acaba reduzida a um lastimável ladrar. É por isso que não basta pôr simplesmente a Bíblia de parte, temos antes de a atirar fora, assim que estejamos fartos dos seus desaforos e da servidão que ela nos impõe. (continua)

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