fevereiro 17, 2009

#10

“Deitado de bruços, sobre a caruma do pinhal, com o queixo apoiado nos braços cruzados, ele ouvia o tempo soprar entre a ramaria das árvores. A encosta da montanha, no ponto em que repousava, tinha pouco declive, mas mais abaixo tornava-se íngreme e ele via a curva negra da estrada alcatroada que seguia o desfiladeiro.” In Por quem os sinos dobram, Ernest Hemingway

OLHANDO O FUTURO

"Ouvia o tempo a soprar entre a ramaria das árvores" e sentia o sol, quente, desse dia de inverno, enquanto deitado, olhando agora o rio que acompanhava a estrada negra e que em contraste refletia o azul do céu, pensava na missão que lhe tinha sido entregue.
Lentamente, irresistivelmente, virou-se de costas para apanhar os raios de sol que se infiltravam por entre a ramaria em pleno rosto, sentindo-se viver, sentindo a energia fluir que fazia o seu coração bater com uma intensidade desconhecida, como se latejasse , o peito todo latejando.
Por uns momentos esqueceu tudo e todos.
Pouco depois, voltou à posição inicial, não tirando os olhos daquele pequeno rio, que se perdia no horizonte, junto com a curva da estrada, sem saber onde acabava o azul da água e começava o azul do céu.
Via, estremeceu, via o campo onde estava, cheio de corpos estropiados, as árvores meias desfeitas, e, ah! viu também aquela figura feminina que se debruçava a cada novo corpo que encontrava, recortada pela luz encarniçada de um poente majestoso, sem saber onde acabava o sangue que empapava aquela terra e começava o céu.
De vez em quando, ela punha-se de cócoras e com esforço virava o corpo que de borco se encontrava. Naquele último…naquele último, percebeu que chorava pelo estremecer dos ombros.
Não conseguiu ficar longe dela, que parecia tão frágil enquanto percorria as mãos pelo rosto, pelo corpo, do homem que ali estava junto aos seus joelhos, enquanto a ouvia repetir desesperada, não! Não! Não!
Tocou-lhe os ombros e quando ela separou o seu rosto do rosto do homem amado, viu-se ali deitado e viu os olhos dela que suplicavam.
Deu por si, olhando aquele rio e aquela estrada, gritando também como ela, não! Não! Não! Gritando, Maria! Maria! Maria!

Por: Maria Anónima da Silva

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