Falarei contigo, beijar-te-ei e direi:
- Meu amor quanta saudade. E tu ficarás como sempre, convencido que a tua chegada é importante, eu que só quero a tua partida, e dirás ajeitando o cabelo e a roupa que amarrotei ao abraçar-te:
- Mas cheguei. E como sempre os teus maneirismos irritar-me-ão, a tua vaidade oca, a tua certeza que te quero. Como odeio as tuas certezas! E direi pegando-te na mão e começando a correr:
- Quero um café, vamos. E seguir-me-ás correndo e resmungando envergonhado:
- Que disparate, toda a gente está a olhar-nos. A mania que tens das boas maneiras, de fazer tudo tão certo que me sinto presa num aquário, dando as voltas que tu queres, sendo como tu queres. E deixarei cair a mala de propósito no meio da estrada cheia de carros, e tu ficarás para trás fazendo o que é certo e correcto, e apanharás a mala e uma pancada de um carro que colocará um ponto final no passado e em ti. E eu do outro lado da rua acenderei um cigarro, para que no fumo desapareça o que de ti em mim resta…
…Ou…
Virás como sempre encontrar-me onde sempre nos encontramos, e esperarei chegares como sempre chegas, como se a tua presença fosse imprescindível para toda a gente, especialmente para mim, e falarás pedantemente de coisas que não interessam a ninguém, dando-te ares de inteligente, monopolizando as conversas como sempre fazes, fazendo-me de vez em quando uma festa displicentemente, como se eu fizesse parte do teu público, como se eu fosse publico, como se eu fosse uma coisa tua, como se te pertencesse. Como odeio a tua mania de falares de coisas que não entendes, como se soubesses tudo. Tu que nem sabes que hoje não chegarás ao lugar onde sempre nos encontramos, porque te esperarei num canto, como uma sniper, e olhar-te-ei pela mira, tu tão minúsculo, tu tão insignificante ao meu olhar, na minha mira, e apontarei cuidadosamente e cairás, e as pessoas juntar-se-ão à tua volta e serás o centro das atenções como gostas. E eu virarei costas a ti caído, a ti passado, e irei esperar-te como se realmente te esperasse, e falarei de ti como se estivesses atrasado, e rirei de ti, sem ninguém perceber, porque sei que não virás, e ficarei triste para os amigos verem, e chegada a hora levantar-me-ei e direi:
- Digam-lhe que fui para casa…
Ou…
Ouvirei os teus passos firmes na escada, os teus passos firmes quando chegas, como que a marcar território, como se estivesses certo da minha ânsia de te ver, como se fosses um presente que te dás, tu um presente! Eu só quero a tua ausência definitiva ou o teu corpo sem ti! E ficarás parado esperando que eu te dispa, como se te desembrulhasse, como se fosses mesmo um presente, e dispo-te e olho o teu corpo que quero, e toco o teu corpo que preciso, e ouço a tua voz que odeio e abomino dizer-me coisas que não me interessam nada. Quero lá saber do teu dia! Quero o teu corpo não te quero a ti:
- Cala-te, penso, cala-te, não digas nada, quero matar esta obsessão e esta vontade pelo teu corpo, quero curar-me de ti, cala-te! E faço amor contigo sabendo que é a última vez, e é melhor do que foi na primeira vez, e é melhor do que sempre foi porque te amo, porque te odeio, porque para te apagar de mim tenho de matar-te, ou matar-me-ei de nojo e ódio de mim porque não consigo resistir ao teu corpo, porque não consigo resistir ao teu sexo, e me humilho e me reduzo a carne cada vez que estou contigo, e digo baixinho ao teu ouvido com ódio na voz:
- Hoje matar-te-ei.
E tu dizes:
- Mata-me de amor.
E sento-me no teu colo e bebo do meu copo límpido de certezas, e pego no teu, e dou-te à boca a beber uma vodka com veneno e ódio, o ódio que me tenho do desejo que te tenho, e a certeza que se não te matar morrerei lentamente, e espero que fiques frio, imóvel e calado, finalmente calado. Levanto-me e lavo-me de ti. Olho-te e já nem corpo és, e digo-te sabendo que pela primeira vez me ouvirás sem me interromper
- Eu disse-te que hoje te matava….
Resposta ao Desafio por: Encandescente
1 comentário:
tragedia romana: muito veneno
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