novembro 22, 2007

Vamos ao Teatro (II)

Cena 2

Menato - (Surgindo) Compadre! Mas é mesmo vosemecê? Quem o havia de reconhecer? Está tão enfezado que parece um carapau seco. Nunca o teria reconhecido. Mas seja bem-vindo.

Ruzante - (Descendo) Enfezado, eu, compadre? Se vossemecê tivera passado por onde eu próprio passei, não falava assim.

Menato - Vem agora mesmo da guerra? Ou esteve doente? Ou saiu da prisão? Tem muito mau aspecto, compadre. Parece um desses salteadores de estrada. Desculpe lá, compadre, não digo que tenha má cara como homem, percebe? Mas é que está pálido, podre, defumado. Puta de sorte, deve ter levado vida de cão.

Ruzante - (Grave) Compadre, é a ferragem que nos põem em cima que dá este mau aspecto. Tira-nos da carne aquilo que pesa. (Tira o capacete e coloca-o no chão) E depois, é beber-lhe mal e comer-lhe pior. Se vossemecê tivera passado por onde eu próprio passei (suspira).

Menato - Porra, está a falar difícil, compadre. Mudou de língua: fala como os doutores.

Ruzante - (Batido na vida) Eh, compadre, quem corre mundo é como vê. E depois, onde eu estava os oficiais falavam assim. E sabe que mais? Se eu começasse a falar como os inimigos, então é que vossemecê não apanhava uma. Com o cagaço, aprendi a falar com eles num só dia. Poça, a arrogância com que dizem: "Filan, cavron, casalho, por sang thiu, foute darr cab carra".

Menato - (Impressionado) C'um escarepe os coma a todos. "Voute dar cabo da cara", entendo eu, compadre. Agora das outras palavras não percebi patavina. Explique lá isso melhor, ó compadre.

Ruzante - Com todo o gosto. "Filan" quer dizer vilão. Campónio, percebe? "Cavron" quer dizer cabrão. Cornudo. Um cabrão de campónio. "Casalho" uma casa de palha, porque vivemos em casas de palha. E "porr sang thiu" por amor de Deus, isto é, vivemos em casas de palha por amor de Deus.

Menato - Mentem com quantos dentes têm na boca. Custam-nos bem caras estas casas

continua...

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