junho 02, 2008

D. Arlete

A D. Arlete é visita quase diária. No nosso serviço e, como sabemos por ser uma figura já familiar, num banco do jardim que fica em frente, a alimentar os patos do lago. Só falta (a uma e a outra obrigação) quando tem que ir aos tratamentos ou quando afazeres extraordinários a impedem de aparecer. Poderia dizer-se que vem para reclamar, não fora o facto da D. Arlete se dirigir sempre aos outros com a mesma aspereza duma borboleta ao pousar num malmequer. Como se adivinhasse, nas almas alheias, uma fragilidade igual à sua.
Nesta última vez, a D. Arlete vinha mais sentida do que é habitual. Como uma criança pequena, sentou-se e amuou. Porque nunca tinha sido convidada para nenhum dos passeios que são organizados, a espaços, para os idosos do concelho.
- Nunca fui a nenhum! Nem um! Nunca me convidaram! Todas as senhoras lá do bairro já foram menos eu! Nem sei o que isso é, meninas!
A funcionária, paciente, explicou-lhe que as participações nos passeios são por inscrições, não por convites, e que se ela nunca tinha ido é porque nunca se tinha inscrito em nenhum. A D. Arlete lamentou-se:
- Ai menina que eu não sabia! Pensava que os convidavam!...
Que não. Mas que não havia problema nenhum porque, voluntariou-se imediatamente a colega, lhe ia buscar um impresso e fazia-se já ali a inscrição para o próximo que houvesse. Era garantido!
Quando ela chegou com o papel, a D. Arlete hesitou uns segundos, como se se tivesse acabado de lembrar de qualquer pormenor extremamente importante, e disse:
- Ah pois é! Mas eu não posso ir a passeios, amor! Não tenho vida para isso!
E, posto isto, levantou-se, despediu-se de todos educadamente e saiu… para voltar no dia seguinte.
Desafio aceite por Manga dalpaka

Sem comentários: