16º
A verdade persegue...
Ele estava nos píncaros da sua preeminência, o sucesso do seu projecto era tal que lhe apetecia festejar. Mas com quem? A única pessoa com quem lhe apetecia partilhar estava em viagem para uma nova vida e fora ele quem a ajudara a partir. Caminhava pela rua, pensativo, fazendo-se acompanhar da sua pasta de executivo. Os seus passos firmes, decididos; cada gesto um prolongamento da sua personalidade, forte e segura; os traços do rosto serenos; na boca o seu sorriso de sempre, cativante. Todo ele era uma espécie de íman, atraindo sobre si boas energias, atraindo pessoas e sucesso. Como podia um homem assim não ter com quem festejar? Era Inverno, era noite, era tarde. Teve de forçar a vista para encontrar o carro no parque de estacionamento subterrâneo. Ao dar à chave, nada. Nova tentativa e nada. Mas que diabo?!! Uns murmúrios no banco de trás, fizeram-no olhar o espelho. Nada, claro. Era só cansaço. De repente, vrummmmmm.... Pareceu perder o controlo e o carro bateu na parede, uns metros mais à frente, estridentemente.... Nada, ninguém por perto.Uma dor de cabeça. Fragmentos de pensamentos chegam-lhe numa torrente sem que ele conseguisse formular um raciocínio concreto. Os murmúrios tornam-se mais fortes, parecem estar dentro da sua cabeça. E ele deixa de pensar só para saber que prosa é aquela, qual a mensagem. Consegue reconhecer a voz dela! E lembra-se daquelas coxas que o envolveram tantas vezes com paixão, numa dócil entrega. Risos ensurdecedores esmagam os murmúrios, interrompem-lhe as imagens do passado, é o riso dela! Murmúrios misturados com risos na sua cabeça gritam-lhe agora a palavra vingança... Vingança! E foi obrigado a recordar o sangue, a faca grande de cabo vermelho... A custo consegue abrir a porta do carro. Deixa-se cair na frieza do chão, numa luta para sentir a matéria, para sentir o seu corpo, para sentir que está ali.... Era tudo imaginação sua, ele sabia-o, invadia-o o sentimento de culpa! Mais cedo ou mais cedo ia pagar caro o pecado cometido!
Por: Fábula